Saturday, April 10, 2010

CONTOS DA RIBEIRA 31


O CHAMADO DA GUERRA



Seu Toim, lá na Passagem da Onça, contava que, no tempo da Guerra (seria a primeira ou a segunda?) ele era um meninote, mas mesmo assim foi sorteado. Sua mãe chorou muito, mas não deu jeito. O que ela pode fazer e fez foram umas duas ou três promessas a São Francisco e a Nossa Senhora e era pra ele pagar assim que se livrasse dessa sorte. Fosse antes ou depois dessa Guerra. (...)




Chegou o dia da partida e ele teve de ir de qualquer jeito. O diabo é que ele tava com um mal no pé que quase não o deixava andar. Teve que ir assim mesmo, pois ouviu dizer que os home do Exército eram muito duros e zangados, não aceitavam qualquer embromação, se descobrissem botavam logo na cadeia. Quando chegou na Capital foi se alojar no Quartel e logo começaram os treinamentos. Mesmo antes dos exames. Era um tal de marchar pra cima e pra baixo e o pé inchando. O diabo do pé engrossava tanto que fazia uma coleira por cima das botas, saindo aquela coisa inchada. Um dia ele soube, por um companheiro mais versado, que logo, logo, ia haver uma espécie de caminhada quando os soldados (ele já era um soldado?) marchavam a noite toda, por uns bons 30 kilometros carregando uma mochila de pano, cheia de coisas e ainda mais uma espingarda. Antes da marcha os sorteados tinham de passar pelos médicos para saber se estavam em forma, se podiam seguir em frente e logo ir pra Guerra. Ele entrou na fila do exame e quando chegou sua vez foi logo dizendo pro doutor que não podia andar que o seu pé tava inchado e que ele tava com esse mal já fazia bem uns dois meses. O médico ordenou para ele tirar as botas para examinar o seu pé. Olhou, olhou e disse pode calçar as botinas.
- Seu doutor eu não posso mais calçar as botinas, meus pés num cabe mais nelas.
- Ta certo. Diga ao cabo para lhe dispensar.
O cabo que ficava na outra sala o mandou esperar e depois de bem umas duas horas chamou-o e lhe disse:
- Pode ir e daqui a uma semana venha tirar a certidão.
Ele não entendeu bem, mas achou que já podia ir embora de volta pra casa. Logo que chegou montou com sua mãe numa burrinha e foi pro Parazinho pra pagar a primeira promessa. E nunca mais soube nada, nem pensou nada nessa coisa de guerra ou de Exército. Isso já faz pra mais de sessenta anos, mas ele ainda tem medo de ser chamado pra faze aquela marcha na capital.


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