Saturday, October 03, 2009

CONTOS DA RIBEIRA 11


OLHOS NEGROS

Sentado em sua cadeira no estúdio ele pensava, pois entre muitas outras coisas Jordão também fazia isso, era uma de suas ocupações. Mas, o que se passava agora é que ele só pensava nela, mesmo ao fazer a barba, todas as manhãs; o pior é que Jordão não só pensava, mas a via no espelho, isto é, via sua imagem no espelho do banheiro; ele continuava a vê-la por todo o dia, ao virar uma página do livro que estava lendo, ao olhar para a parede coberta de quadros dos mais diferentes artistas – reproduções, bem entendido – ao olhar para as portas e por aí vai. (...)


(...) Quando saia de casa a imagem dela o acompanhava em cada rua e esquina, em cada sinal, em cada vitrine de loja e em cada café, na bilheteria do cinema. Era uma verdadeira perseguição. Ele via sua imagem com os olhos e com a mente – não seria o mesmo? - e, ele a via também quando, no quarto, deitado em sua rede vermelha, em completa escuridão e com os olhos fechados ele via seu rosto redondo, os olhos negros e brilhantes, o cabelo curto e preto com um coque minúsculo preso com uma pequena e estreita fita vermelha. O pior eram os olhos negros, pois eles emitiam um brilho forte, magnético que o atraíam particular e irremediavelmente. Atraiam para onde e para o que? Ele não conseguia ter uma resposta para essas duas simples indagações. Nessa noite ele via seu corpo de costas e a reconhecia perfeitamente, pois ele tinha, muitas vezes, mirado e admirado suas curvas quando repousava nua, deitada na cama no apartamento da Rua do Azevedo. Agora, quando depois de pigarrear, ele consegue atrair sua atenção para ver seu rosto brilhante e ela se volta em sua direção ele não vê mais que uma face sem nenhuma definição de rosto, boca, nariz e os grandes olhos negros com os quais ele estava acostumado a se mesmerizar.

Fza 18mar09

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