Saturday, October 16, 2010

CONTOS DA RIBEIRA 45


MAIS UM APOSENTO PRO SEU ZÉ

Seu Zé passava os dias sentado na cadeira de balanço, aquela de vime pintada de branco sempre deixada na varanda. Ele tomava sol até as dez horas. O velho não lia nada, apesar dos livros e jornais postos ao lado por sua filha Edilse, a mais velha, seu xodó de toda a vida. Agora ela não podia e nem queria ter pena dele, pois segundo as doutoras que cuidavam do Pai isso não era coisa boa para sua saúde. Saúde de quem? Pergunta-se. De ambos, diziam logo as doutoras formadas pela USP. (...) O que é certo é que o Velho ficava lá sentado, tomando a fresca das manhãs, ouvindo os carros passarem em desabalada carreira e prestando atenção em quem entrava na casa. Muita gente chegava lá. Vinham do interior trazendo encomendas, pedidos e muitas vezes para um dedo de prosa com os de casa. Eles tinham deixado um enorme rabo lá na Ribeira, e mesmo com a doença de Seu Zé, não se desligavam de lá. Pudera, de lá vinha uma pequena parte do dinheiro que girava na casa. Girava uma ova, só passava, pois dinheiro era como sabão, escorregava e caia pelo ralo. Certo dia chegou até a casa que ficava na Aldeota, o Deca. Este era um agregado do Homem lá da Ribeira e sempre trazia alguma coisa escondida no carro para a Edilse, pois eles, os de casa, não se davam com o povo do Homem, nem com ele. O Deca entregou um embrulho a moça e ficou querendo conversar com Seu Zé. Como sabemos este mal dava sinal de vida, não respondia às perguntas que se faziam, nem mesmo os filhos conseguiam tirar alguma palavra dele. Mas o Deca não estava avisado disso. - Seu Zé como o senhor está? Está corado... - ... - O senhor sabe que agora na Ribeira foi montado um hotel para os toristas na beira do Rio e que se chama “Posada Hipopotra”? Dizem que o dono é o Home. Ninguém sabe por que esse nome. O que era pra ser era “Posada do Jacaré” mode o bicho que apareceu lá no Rio e comeu o Zé Maria, marceneiro. O pior Seu Zé é que estão dizendo que o Zé Maria num ta morto ele ta vivinho da silva mangando da gente que ta do lado de fora sofrendo com essa esculhambação toda. Seu Zé continua como estava, isto é, nada responde. Certamente ele prestava atenção, mas era como se estivesse a quilômetros de distância. Nisso Edilse chega à varanda já querendo distrair o Deca, pois seu pai não vai mesmo responder coisa alguma. - Dona Edilse será que Seu Zé num tem né ostopor? Era bom dá para ele umas sardinhas; o povo lá da Praia dizem que é muito bom pra ostopor. Quando eu voltar vou passar lá na Barroquinha e trazer umas sardinha pra ele. - Obrigado Seu Deca. Vamos ver se serve para o que ele tem; só que ele não tem esse negócio de ostopor, aí não. Mas pode ser... - Dona Edilse, me discupe dizer isso, mas todo mundo lá na Ribeira se preocupa com o Seu Zé. Promode que parece que as despesas aqui na Capital são muito grande. Agora lá apareceu uns home do governo e está indo oferecer aposento pra todo mundo. Será que ele não pode ter um? É um dinheirinho que dá pra comprar remédio. Era bom o seu cunhado lá fala com o Home para conseguir esse aposento pro seu pai. - Seu Deca, se isso é aposentadoria, meu pai já tem a dele. E não precisa de outra. Deca olhou para a moça e ficou imaginando se ela era amalucada, pois mais uma aposentadoria do governo era uma coisa que ninguém, ninguém mesmo, recusava. Imagem de: http://www.retirementplanning55.com/2009/01/early-retirement-planning-can-lead-to.html

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