Saturday, November 20, 2010

A VIDA AVENTUROSA DE TROFIM VASEC EM DIVERSOS CAPÍTULOS – 19


PEÇAS PARA O MUSEU

Após o desaparecimento de Talzinho lá no Pé da Serra do Zé, comido pela onça que fazia morada na Fazenda do Zé de França e comia todas as suas criações, um grande número de histórias envolvendo este nosso herói começaram a aparecer. Muitos diziam que um lobisomem andava assombrando as pessoas pros lados do cemitério e que a mula sem cabeça passou a aparecer mais vezes na parede do açude; diziam também que o curupira fazia das suas pela Várzea Seca. O que é fato é que a população estava assombrada e, se forem somados os estragos que a onça do Zé de França continuava a fazer era mesmo de assombrar todo mundo. (...)


Foi por esse tempo que o Senhor Bispo encarregou seu povo de procurar imagens de santos nas fazendas para ornamentar o novo museu que ele tinha mandado construir e estava quase pronto para inaugurar. Só da Ribeira tinha ido um monte de coisas, entre alfaias de todos os tipos, sinos, instrumentos musicais, cadeiras e santos de madeira. Pelo sertão adentro todos procuravam o que mandar para o Senhor Bispo. Cemitérios antigos, do tempo dos índios e dos baianos, eram vasculhados à procura de imagens e outros objetos; casas de fazenda com seus santuários eram vasculhadas e seus moradores obrigados a entregar os quadros e santos expostos nas camarinhas. Eles não podiam vender, pois o museu não tinha dinheiro para comprar, mas se não entregassem os objetos o castigo cairia sobre eles.

Quando pessoas, entre as quais estavam Trofim Vasec e Zé de França, participantes de um dos grupos encarregados dessas buscas por objetos pios lembraram que o cemitério poderia ser uma boa fonte de imagens e outros itens foram até lá. Ao chegarem sentiram uma força de atração enorme que os levou até o túmulo onde fora sepultado Talzinho, há poucos meses. Uma pequena investigação os convenceu que o local havia sido profanado. A palavra talvez não seja profanado, mas de qualquer modo o túmulo parecia ter sido aberto e de dentro para fora.

Eles verificaram cuidadosamente que o Talzinho de madeira que havia sido sepultado continuava sepultado, mas de um modo evidentemente diferente do que acontecera no dia de seu enterro. A muito custo eles conseguiram dialogar com Talzinho, mas verificaram que ele se recusava a participar do movimento, isto é, ele não admitia ser doado para o museu sacro do Senhor Bispo. Por mais que seu velho amigo Trofim Vasec tentasse convencê-lo da justeza da causa ele se mostrava irredutível. O nosso amigo eslavo chegou a acenar com muitas vantagens para a cidade assim como para eles agora separados pelo muro intransponível da morte.

Após uma longa conversa Talzinho diz que ele, na situação em que se encontrava agora, tinha até mais liberdade de movimentos e ações do que tinha anteriormente. Ele admitia que não tivesse mais aqueles achaques todos e todos os seus penduricalhos funcionavam a pleno vapor. Ele admitiu que andasse até muito ocupado tentando dar conta de tudo quanto era cabritinha que aparecia nas vargens quando ele vagava nas noites de lua sobre a parede do açude.

Foi com por essa conversa do amigo que Trofim descobriu terem explicação as aparições que assustavam o povo na parede do açude e nas várzeas em dias de lua cheia.


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