Sunday, August 15, 2010

A VIDA AVENTUROSA DE TROFIM VASEC EM DIVERSOS CAPÍTULOS – 12


EXPORTANDO CERA DE CARNAÚBA PARA A RÚSSIA

Já fazia muito tempo que Trofim Vasec tinha aportado na Ribeira, depois de ter saído de sua terra e de ter peregrinado pelos sertões. Logo após sua chegada o eslavo casou com a herdeira do Coronel Totonho, talvez o homem mais rico e importante da cidade. Sogro e genro davam-se muito bem e faziam progresso juntos nos negócios. Muitos dos projetos iniciados pelo sogro ele os passava para Trofim, para que o eslavo os desenvolvesse. Entre esses estavam os negócios com cera de carnaúba. (...)



O Coronel Totonho já ganhava muito dinheiro com a compra e exportação desse produto que passou de uma simples matéria prima usada na confecção local de velas para um produto muito requisitado em mercados europeus. O Coronel imaginou que através de Trofim ele pudesse atingir os mercados da “mãe Rússia”, pois ele acreditava ser essa a pátria de seu genro.

Conversa vai, conversa vem e sem se incomodar com o detalhe de sua pátria, logo Trofim se dedicou a procurar e descobriu os endereços de algumas firmas em São Petersburgo nas quais antigos amigos seus trabalhavam. Ele, então os consultou sobre seu interesse em importar a cera produzida na Ribeira pelas fábricas do Coronel. Ele bem sabia que o Coronel não tinha fábrica nenhuma, ele era somente comprador e exportador do produto. É bom que se diga que ele era o maior comprador de cera de carnaúba de toda a região norte da Província.

Uma das firmas russas que se interessaram pela compra da cera de carnaúba da Ribeira foi “Underbog-Rade” que, após negociações rápidas se prontificou a comprar 1.000 toneladas a um preço bem superior ao que o Coronel havia contratado em Liverpool no ano anterior. Fechado o negócio os russos depositaram no Banco do Império, filial de Nova York, um adiantamento de 10% da compra total. Os embarques começaram em setembro com a primeira remessa de 100 toneladas em um navio (Dunstan) da companhia Singlehurst & Cross Line saindo do porto de Camocim.

Logo após o primeiro embarque o eslavo viu que não podia entregar essa grande quantidade de cera, pois simplesmente eles não tinham onde compra-la. Além da produção no ano não ter sido boa, havia muitos outros compradores competindo pelo produto na região. Trofim trouxe, então, ao Coronel Totonho um plano ousado para resolver a situação crítica de não ter como entregar um produto já vendido.

Em conversa com o Fransquim do Seu Chermont o eslavo soube da existência de um material, um mineral muito pesado e que se unia à cera de carnaúba derretida. Fransquim sabia tudo sobre o tal mineral, inclusive que a Grande Cerâmica, como o nome indica a grande fábrica de telhas e tijolos, de propriedade do Coronel Leonardo, o utilizava na confecção de telhas e tijolos. O produto era conhecido como caulim e podia ser adquirido no Pará a preços bem accessíveis, não chegando a 5% do preço da cera de carnaúba.

Após alguns rodeios Trofim põe o Coronel Totonho a par do plano que ele e mais o Fransquim do Seu Chermont e Talzinho, o filho do Dr. Tal haviam bolado para que os prejuízos dele e do Coronel não fossem tão grandes como estava parecendo. Certamente eles não conseguiriam comprar toda a cera vendida aos russos e teriam de reembolsá-los com dinheiro vivo. Trofim não teve muita dificuldade em convencer o Coronel da viabilidade do plano. Aliás, seu sogro sugeriu uma pequena mudança nos planos. Ao saber da pretensão de comprar o caulim no Pará ele foi contra, pois afirmou que o mineral em pó deveria ser extraído de minas situadas a poucos quilômetros da Ribeira, bem no caminho da Angica. A mina ficava nas terras de um compadre do Coronel e seria muito fácil trazer o produto de lá. E ficaria bem mais barato.

O caulim começou a ser estocado na Fábrica de Cera do Zé Antônio onde se derretia o pó do Coronel e de Trofim. Este, auxiliado pelo Fransquim, instruiu o Zé Antônio como deveria fazer para seguir com o plano. Para cada 10 quilos de cera gorda derretida no tacho ele deveria juntar 1 quilo do pó de caulim. Depois era só esperar para quebrar a cera e ensacar nos sacos de estopa para 90 quilos, novinhos e já com a marca do Coronel estampada.

Ao fim de alguns dias de trabalho - dia e noite - o Zé Antônio tinha preparado 1.000 sacas de cera (com caulim) prontas para serem levados no trem e em canoas para Camocim e de lá seguir para a Europa. Logo após esse primeiro embarque, feito no navio da Singlehurst & Cross Line, o Zé Antônio começou a preparar outra partida com as mesmas especificações. Para falar a verdade o Zé Antônio preparou e foram enviadas mais 400 toneladas da cera preparada por ele.

Pelo começo de janeiro aportou na Ribeira um senhor vestindo linho branco e portando um chapéu Panamá a procura do Coronel Totonho e de seu sócio. O cavalheiro, que se chamava Herr Bronsk, foi recebido pelos dois no próprio casarão. E, sem muita conversa, puxou um documento, nada mais nada menos do que uma folha com o timbre do laboratório oficial de análises do Departamento de Importação do Império Russo, de São Petersburgo. O documento mostrava que o produto enviado pelos dois para a firma “Underbog-Rade”, supostamente 500 toneladas de cera de carnaúba continha em média 10% de caulim. O que eles tinham a dizer, perguntou aos dois.

O Narcizo, gerente do Armazém do Coronel, que não sabia nada sobre o “negócio russo”, observava de longe os três conversando. Após umas duas horas de negociações Herr Bronsk despede-se do Coronel e de Trofim e vai para a Estação tomar o trem para Camocim onde, disse ele, embarcaria para a Europa no Dunstan.

Ainda hoje na Ribeira não se sabe nada sobre essa entrevista, mas é certo que os carregamentos de caulim da Angica cessaram.


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