Saturday, July 10, 2010

A VIDA AVENTUROSA DE TROFIM VASEC EM DIVERSOS CAPÍTULOS - 10


CONVERSAS NA HORA DA VIRAÇÃO

Logo que o eslavo Trofim Vasec chegou à Ribeira foi se acostumando com os bons e os maus usos da cidade. Ele gostava muito de tomar banho no Rio, nos poços mais profundos, como o Pucu e mesmo na Barragem. Ele só tomava banho sem roupa, nu mesmo e sempre acompanhado de um caboclinho que ele tinha em sua casa. Gostava também de jogar bilhar com os novos amigos no Bar do Seu Nicácio, mas nunca ganhava uma partida. Mas o melhor de todos os “programas” que Trofim fazia era sentar-se na calçada da casa do Coronel Totonho, tomando a fresca da tardinha, a hora da viração, e conversar miolo de pote com seu sogro enquanto observava o povo que voltava da Praça do Mercado no rumo de casa.

(...)


Nessas tardes eles conversavam sobre assuntos que só alguns da cidade tinham conhecimento. Um desses mexericos, isso mesmo mexericos, era a situação do Padre Lisboa. O jovem sacerdote, recentemente chegado de Caiçara, causava muito interesse do público feminino. Talvez por ser um homem bonito e de conversa muito agradável. O caso é que ele era querido por todos: mulheres e homens e crianças. Mas, na cidade pequena logo a maledicência ganhou foros de verdade e ao Padre Lisboa foram atribuídas namoradas, algumas bonitas outras, nem tanto. Havia muitas fofocas envolvendo diversas senhoras e senhoritas e o padre. Mas o último boato foi o que dizia ter Padre Lisboa sido encontrado atrás do altar mor da Igreja Matriz agarrado com Dona Isolda. Esta era uma moça prendada e muito bonita e que se dedicava a obras de caridade ligadas à Igreja. Na conversa dessa tarde comentava-se que o Dr. Tal havia flagrado os dois há uns dois dias. O Coronel Totonho logo foi de opinião que o Dr. Tal seria incapaz de, ao descobrir o casal em colóquio amoroso, bater com a língua nos dentes. Trofim, ao contrário, acreditava piamente que o advogado faria exatamente isso, bater com a língua nos dentes.

Outra história que Trofim e o Coronel Totonho ouviram e comentavam era aquela da aparição de uma alma pelas ruas da cidade. Diziam alguns terem visto, assim pelas duas horas da manhã de uma noite escura, um vulto atravessar a rua na altura do Curro e se esconder por trás de uma enorme pedra que há por lá. Todos tinham uma idéia de quem seria essa alma penada. Agora dizer quem era, assim na bucha, ninguém tinha coragem. Trofim e o Coronel chegaram, depois de algum debate, a uma conclusão: era melhor ninguém tocar nesses assuntos de alma penada.

Os dois gostavam de conversar sobre as notícias que o menino Juca enviava do Rio de Janeiro onde estava estudando para ser doutor advogado. Ele contava muito sobre a beleza da cidade e da vida difícil que levava. Vida de estudante é uma dureza, mas pode ser agradável no Rio. Comentava sempre o comportamento do conterrâneo Talzinho, o filho do Dr. Tal que tinha ido estudar Medicina na mesma época que ele fora para o Rio. Parece que Talzinho gastava todo o dinheiro que recebia em uma vida de esbórnia e de devassidão. Quando essas cartas chegavam e os dois as liam ficavam horrorizados e passavam a vaticinar o futuro mais sombrio para o filho do Dr. Amâncio de Tal. Quando este chegava para um dedo de prosa os dois tratavam de esconder as cartas e desconversar. O advogado era ladino e passou a desconfiar de alguma coisa. Entretanto nada demonstrava, mesmo porque, Talzinho tinha toda liberdade e seu pai esperava mesmo que ele fosse um retrato do que ele próprio era.

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