Tuesday, March 18, 2008

O Povo da Malhadinha/O Povo da Granja 45



A Lelé


Maria Nazaré Pereira


Quando começava a viração ela punha, com alguma dificuldade, a cadeira em frente à sua pequena casa de taipa perto da estação, para tomar a fresca. Poucas vezes passei por lá, já bem depois de ter recebido todas as atenções que ela me deu e que eu não valorizei na época. Menino é assim mesmo, eu pensava. Não, não é não, penso agora: como menino, não reconheci ou agradeci o que Lelé fez por mim. Nunca ouvi dela a voz alterada para reclamar algum malfeito de seu afilhado querido. Ela nunca olhava nos meus olhos – ela, uma mulher idosa e eu um pirralho vadio. Ela trazia essa submissão dos tempos antigos, de seus pais e de sua gente, que eu não tinha a menor idéia de quem tivessem sido ou de onde vieram. Tenho desconfiança que em minha casa ninguém sabia também. Certamente ela foi uma das muitas pessoas cujas famílias chegaram à cidade tangidas dos matos pelas secas e ficaram sem ao menos ter um nome completo: Nazaré, a Lelé.

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