Saturday, October 31, 2009

CONTOS DA RIBEIRA 14


CINEMINHA

Marco era um voltante do Maranhão onde fora em busca das origens do Coronel; ele procurara os registros de casamento no velho cartório do primeiro ofício e o registro de firmas dos primórdios da Associação Comercial e tivera algum sucesso, pois agora ele sabia que o Coronel Carvalhedo havia casado com uma das filhas de João Pinto Ribeiro, um abastado comerciante na praça de São Luis. O que restava a ele agora era colocar tudo em seu devido lugar para a apresentação que faria no Gabinete de Leitura do Doutor Antonio Augusto no próximo sábado. E esperar que aparecesse alguém para ouvir o que ele tinha para contar. (...)


Sentado em frente ao micro ele olhava a parede branca ou seria melhor dizer de um creme bem claro, mas sem dúvida imaculada, sem qualquer mancha de dedos ou riscas de lápis. Ele comparava essa pureza ou limpeza com o estado atual, exaurido, de sua mente: após ter fechado os arquivos Word onde gastava tempo escrevendo contos, histórias, lembranças e impressões do que lhe acontecia diariamente, após fechar o dicionário no qual tirava suas inumeráveis dúvidas, ele que não sabia nada da língua, após fechar os sites de jornais - sempre abertos, os blogs de política, pró e contra o governo, que ele não era radical; os blogs dos amigos e das amigas, um destes tornou-se um ponto de apoio e reflexão importante; sites de humor e de mulheres bonitas, somente a tela de proteção restou brilhando no monitor. Por mais que procurasse alguma coisa de importante gravada em sua mente nenhuma mensagem se apresentava. Para que havia ele passado boa parte de sua vida alisando bancos de escola? Agora, quando se aproximava seu inarredável encontro com Ella acontece-lhe o inesperado, talvez alguma coisa que traga um pouco de animação para esses dias tão secos por que tem passado. Aconteceu que súbita e vagarosamente a tela brilhante do monitor se iluminou como se fosse uma projeção cinematográfica. Certamente não como em um cinema, que se tem um escurinho aconchegante, mas tão forte como se ele estivesse em uma sala com um moderno projetor. Ele caminhava na calçada da morada e, do lado oposto, abria-se uma porta com cenas nítidas como se fossem as cenas iniciais de um filme, mas só que sem os créditos, que esses muitas vezes atrapalham o espectador ansioso pelo início da projeção. Vagarosamente aparece na tela uma figura quase que angelical, com seu cabelo bem preto e curto ainda assim amarrado no arremedo de um coque preso com uma pequena fivela preta. Ela, em câmara lenta, mexe e remexe as peças de roupa que tem para vender. Com o continuar do filme Marco até adivinha que ela vai virar a cabeça em direção à frente da tela como que procurando por seu olhar. Ela o fez e com um bônus: sorriu para ele. Ele então devolve o sorriso acompanhado de um curto aceno que ela logo retribui. O filme é interrompido pela porta ondulada de ferro que fecha a loja de eletrodomésticos vizinha à lojinha onde ela trabalha. Em frente ao micro ele tem um sobressalto e acorda desse sonho estranho, mas delicado. Marco não consegue mais tirar os olhos do monitor que pisca o tempo todo. Subitamente a sua sessão de cinema recomeça e, agora, ele resolve avançar até a lojinha. Depois de algum debate interno ele decide que essa seria a melhor solução, pois ele não iria deixar a daminha – assim ele passou a chamar a garota do coque curtinho - sair de seu trabalho só para falar com ele. Ele chega à frente do balcão e ela o encara com um leve sorriso e pergunta o que ele deseja. Ele responde:
- Eu mesmo não sei. Talvez uma roupinha para criança.
- É, mas eu acho que você não quer mesmo uma roupinha para criança, não...
- Verdade. Eu só quero conhecer você, pois esta é minha primeira experiência com uma daminha que me lembra muito a Rosa do Cairo. Você já ouviu falar na Rosa do Cairo?
- Não. É algum filme?
- É e você parece com a Rosa.
- Será que tem esse DVD na locadora? Se tiver então podemos vê-lo juntos lá na casa da minha madrinha.
- Então ta. Eu vou alugar o filme. Até a noitinha.




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Friday, October 30, 2009

POEMAS BARRETO/XAVIER 90


Este é um poema de Lívio Barreto (1870 – 1895)

MANHÃS DE OUTUBRO

Frias manhãs de Outubro, neblinosas,
Cheias de aroma, cheias de tristeza
Para minh´alma que se estorce presa
Nas rôscas das saudades angustiosas,

Sois para mim como esfolhadas rosas
Cobrindo o altar onde minh´alma reza,
E onde arde noite e dia sempre acesa
A lâmpada das dores tormentosas.

Frias manhãs de Outubro, eu vos adoro
Mesmo cheias do pranto das neblinas
Que é como o pranto que eu de noite choro.

As vossas névoas trêmulas e finas
São como contas pálidas; e eu oro
Vendo-as descer, as pálidas neblinas!

- 93 -


O poema está completo.


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Thursday, October 29, 2009

Aforismos do Velho Inaço 4


Os voto dos finado ajuda os negóço do Home.

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Wednesday, October 28, 2009

HISTÓRIAS DE JORGE RAPOSO 26


COSTA SUJA

O caso da família Cerqueira Vale é interessante. A mãe da jovem Joana, Dona Ana Francisca Pereira esposa do Coronel Viriato Raimundo da Costa queria casá-la, mas isto não era fácil, pois faltavam pretendentes adequados. Certo dia apareceu na Ribeira um moço bonito chegado da terrinha e que havia sabido da vontade da mãe da jovem em casá-la. Ao apresentar-se à matriarca ela lhe pergunta o nome de batismo:

- É Tomas Cerqueira da Costa, Senhora.
- Pois não casa com minha filha com esse nome!
- ...
- O Senhor vai ao Cartório do compadre Miguel Polycarpo e diz que eu lhe mandei trocar seu nome para Tomas Cerqueira Vale que é o nome que o Senhor vai dar para a família que formar com minha filha. Eu já tou cheia de tanta Costa suja na minha.

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Tuesday, October 27, 2009

HISTORIETAS DO MEIO DA SEMANA 103


VENENO CRUEL

Eles eram bem considerados na cidade e por isso tinham um grande número de afilhados, como era o costume. Esses afilhados e seus pais, os compadres e comadres, vinham da roça ou dos matos, como se dizia, para fazer compras, ir à Igreja, procurar médicos ou outros recursos de saúde e demoravam alguns dias hospedados na casa grande. Uma dessas afilhadas, uma menininha veio, acho do Recanto, para se tratar, pois tinha tomado acidentalmente, com certeza, uma solução de soda cáustica usada para lavagem de garrafas. Ela ficou em uma camarinha escura, e raramente se mostrava às crianças. Passaram-se alguns poucos dias e soubemos pelos adultos que ela havia morrido. Depois soubemos que seu nome era Hilária...


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Monday, October 26, 2009

ISTAMBUL

(Clique sobre a figura para melhor visualização)


Afora as primeiras povoações do Neolítico a cidade de Istambul, atualmente com ca. de 12, 5 milhões de habitantes, originou-se como Bizâncio, colônia grega dos anos 600 AC. Após ter sido tomada pelos romanos e renomeada de Nova Roma, a cidade, agora Constantinopla – cidade de Constantino – foi sede do Império Bizantino ou Império Romano do Oriente. Os turcos otomanos tomaram a cidade em 1493 transformando-a na capital seu império que durou até o século XX.

Istambul, a “Pérola do Bósforo”, é uma cidade fascinante por sua história, arquitetura e pelo povo. Aqui postarei de minha escolha, algumas imagens tomadas em viagem recente. Por outro lado há textos interessantes sobre a cidade aos quais remeto à consulta do leitor: na Wikipedia, “A Istambul de Orham Pamuk” entre milhares de outros.


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Sunday, October 25, 2009

HISTORIETAS DE SEGUNDA-FEIRA 145


NO CÉU-DA-BOCA

Ele era um famoso Biologista Molecular, com grande experiência em clonagem de genes de plantas. Certa ocasião fazia uma conferência para uma assistência superior a duzentos cientistas de diversas nacionalidades. Já quase ao final da demorada palestra ele a interrompe para beber água. Afirmou então que iria “tomar um copo d’água antes que minha língua pregue no céu-da-boca”.


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CONTOS DA RIBEIRA 13


A HISTÓRIA DE DARLAN

Sentado no banco da pracinha subitamente João é interrompido por um barulho, barulho mesmo - não é ruído - de uma moto preta que ele logo identifica como uma Honda Titan ES que risca à sua frente e para. De dentro do capacete também preto logo retirado sai a cabecinha bem formada de Anahí (bela flor do céu). Ela lhe dá um bom dia alegre dizendo: (...)


- Oi! Eu ainda não lhe havia visto! Quando você chegou?
- Oi! Que prazer! Eu cheguei há uns três dias e até perguntei por você...
- Olha, eu passo os dias trabalhando, quando não é no escritório viajo para o interior vendendo esses cavalos de ferro!
- Ôps! E você gosta do trabalho? Pelo menos dá dinheiro?
- Dá sim, pois estou bem melhor de situação do que naquela época da Faculdade.
- E o namorado? Ainda é aquele mesmo?
- Não... Estou com outro. Bem mais velho, talvez seja assim da sua idade!
- E eu, hein?
- Ah! Nem lembra! Me dá uma saudade daquela época em que a gente ia ao Campus todos os sábados... Escuta o que você faz aqui?
- Ué! Estou lendo aqui nesse sossego. E você vai para onde?
- Vou na casa de uma amiga, nós vamos alotar por aí...
Anahí faz um gesto de quem vai colocar o capacete e ele vê e quer que ela se despeça:
- Então ta... A gente se vê por aí...
- Tchau.
- Tchau.

Não havia muita escolha, ou melhor, não havia escolha alguma, pois a única praça na cidade que havia sobrado da fúria destruidora era a da Igreja de São Benedito. A praça é tão pequena que não tem mais de seis bancos e um outro tanto de algarobeiras. Pois foi para lá que ele se dirigiu na manhã do domingo para continuar a leitura do romance que havia interrompido já antes da viagem. Ele retomaria a leitura de “Vidas Secas” e estava curioso para ver como Graciliano Ramos contaria a história de Fabiano e de sua família de retirantes. Na verdade a pracinha tinha mesmo sobrado da destruição quase total das praças da cidade. Ele até se perguntava se essa faina destruidora tinha alcançado os distritos. Será que ela tinha chegado a Paraubina, terra de gente influente? Ou a Ibutira, onde até a Informática e Internet tinham chegado com tudo? Havia lá um moço que vendia materiais de informática e outro que tinha um blog, isso no distrito com somente 8000 habitantes. Estes novos equipamentos poderiam ser um freio para esses desmandos que todos vêm, mas ninguém diz ou faz coisa alguma. E há quem diga ser isso democracia. Restava conferir, como dizem os jovens, talvez sem noção de que se pode conferir muita coisa. Pois bem, ele sentou-se em um banco, desses antigos, de concreto, reminiscência dos primórdios da nova era, talvez do início da década de 1960. João não estava sentado comodamente, mas contraditoriamente ele se dispunha a esperar que alguém passasse a caminho das compras, pois a praça ficava no caminho do Mercado, o reconhecesse e parasse para um dedo de prosa. Não precisava nem reconhecê-lo, era só estar interessado em trocar ideias com alguém tão estranho que, para ler um pouco, tivesse tido a coragem de sentar-se em plena manhã, - noves horas, mais precisamente, - de um domingo ensolarado, mas fresco, pois havia chovido na noite anterior. E tinha sido até agradável dormir em sua rede vermelha.

Como fazia já bem mais de uma semana que ele havia interrompido a leitura de Vidas Secas e não havia marcado a passagem interrompida João demorou algum tempo para localizar o trecho que lhe interessava. Após reiniciar a leitura ele descobre que Fabiano vai em cana porque um meganha não simpatiza com ele e convoca o destacamento para lhe dar uma surra.

Nisso um carro preto, rebocando enormes caixas de som, estaciona a cinco metros, se tanto, de onde ele está. Ao descer do carro o motorista se dirige ao reboque e começa a mexer em fios e tal. Mais que depressa João abandona o banco que o havia recolhido desde cedo e vai em direção a, nem mesmo ele sabe aonde. Pois não há mais praças nas proximidades. Ao ouvir o barulho que vinha da pracinha em que estivera até ha pouco ele sabe que um dos candidatos a prefeito vai fazer propaganda enganosa pelas ruas da cidade, em pleno domingo. Ele acertou, mas não totalmente, pois o carro sai vomitando seus sons ensurdecedores e deixa a pracinha e seu banco livres para estacionar bem mais lá longe. Ele volta para continuarar a leitura interrompida.

Daí a pouco e ele já empolgado com as aventuras de Baleia, aparece-lhe à frente um senhor alto, com a barba por fazer e vestindo camisa e calças surradas que o cumprimenta:

- Bom dia. E faz menção de ficar ali em frente estático. João diz:

- O Senhor não quer sentar?

- Não obrigado, vou passando, pois vou até a padaria ver se compro pão e leite pro café. Ele continua: - Como é seu nome? Eu já lhe vi pela rua...

- Eu sou o João, filho do Sebastião Cunha.

- Ah! Conheci muito seu pai, um homem honrado e muito instruído.

- E o Senhor qual seu nome?

- Eu sou o Darlan, filho do Antônio Bento. Sou primo do Francisco Bento. Eu acho que este trabalhou no Armazém do seu Pai, no tempo antigo.

- É, pode ser, mas eu não lembro. E o que você faz?

- Eu sou aposentado pelo Estado. Eu era carpinteiro, mas fazia de um tudo. Trabalhava de empreitada e quando aquela ponte grande estava sendo construída o engenheiro responsável soube que eu era capaz e me chamou para fazer os moldes dos pilares de concreto.

- Ah! Legal!

- Pois é. Tive muito trabalho, mas como eu era bom mesmo no meu ofício a ponte foi inaugurada no prazo. Eu não tive muito estudo sabe? Mas saber fazer os cálculos todos eu sabia. Ainda trabalhei alguns anos em construção com esse engenheiro, mas aí tive um problema de saúde e fui aposentado.

- E a aposentadoria dá para o sustento de sua família?

- Dá o que Seu João! As despesas são muito grandes. Meu filho mais velho tem problema nos rins e precisa tomar muitos remédios que são caros como todos. Imagine o Senhor que só uma caixa custa quase cem reais e dá só para quinze dias. O dinheiro não dá pra nada. O pior é que eu fui enganado por essa história de aposentadoria consignada.

- Como assim? Não pode esquivar-se João.

- Nem queira saber. Apareceu um dinheiro na minha conta, pouco mais de mil reais, e no Banco disseram que era o empréstimo que eu tinha feito! Se eu não fiz empréstimo nenhum...

- E então?

- Aí não teve jeito, pois o dinheiro ficou sem ser meu! Mas, o pior foi que minha mulher quis gastar o dinheiro e eu fui no Banco e tirei...

- E agora?

- Pois é agora estão-me cobrando e eu não tenho como pagar...

- O Senhor já foi no Defensor Público?

- Já e ele me disse que não pode fazer nada, pois eu tirei o dinheiro.

- Ah Seu Darlan...

- Pois é Seu João. Bom, eu vou embora pegar o pão e o leite. Foi muito prazer conhecer o Senhor.

- O prazer foi meu. Até logo.

João voltou para a tragédia de Fabiano e sua família que, pelo menos estava só nas letras de Graciliano Ramos.




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Sunday, October 11, 2009

HISTORIETAS DE SEGUNDA-FEIRA 144


ENCONTRO NO AVIÃO

Ele foi quase o último a entrar no avião. Encontrou seu lugar no corredor e se ajeitou com a bagagem e o casaco. A cadeira vizinha estava ocupada por uma pessoa, mulher jovem, de quem, a princípio ele não viu o rosto. Quando o avião estava em velocidade de cruzeiro e a cabine mergulhada na escuridão, só com claridade da tela onde o filme da noite estava para começar, a jovem se mostrou em toda sua beleza. Ela era morena, alta, cabelos pretos, lisos e longos; os olhos eram dois poços de uma escuridão mais negra do que qualquer coisa que fosse possível imaginar. Logo depois era ele quem dormitava. Algum tempo depois ele sente uma pressão sutil em seu braço e desperta de um semi-sono. Levanta os olhos e vê aquele rosto lindo sorrindo para ele. Ele a reconhece e responde à sua indagação silenciosa: - É! Dormi...


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Saturday, October 10, 2009

CONTOS DA RIBEIRA 12


A CHEGADA D´ELLA

São seis horas e ele ouve um carro parar em frente e logo seguem dois toques breves de buzina. Ele sabe quem está lá e dá uma ordem com sua voz que está bem fraca:

- Ô Maria Inês vai lá fora e diz que eu vou já. Que estou terminando umas coisas e vou num minuto. (...)


A empregada, um misto de governanta e enfermeira olha pra ele e hesita em cumprir a ordem. Jorge insiste e ela vai intrigada. Quando volta entra no escritório e diz que a pessoa que o procurava tinha ido embora. Ela aproveita para dar-lhe um copo de suco de caju diet sem gelo que é como ele gosta, ou melhor, suporta. Maria Inês não traz mais as frutas cortadinhas com mel de que ele gostava tanto. A dieta do Patrão, como ela o chama, está restrita a sucos e de vez em quando uma barrinha de cereais, também de baixas calorias. Ela não sabe mais o que fazer, pois ele está emagrecendo a olhos vistos, com olheiras e, para piorar não se cuida mais. Ainda há dois dias ela transmitiu pra ele o telefonema que atendeu:

- Patrão a Marcinha do salão ligou e disse que estava-lhe esperando.

Ele tirou o olhar da tela do micro e balançou a cabeça em sinal de negação.

Maria Inês mantinha seus filhos informados de tudo. Eles vinham visitar o pai, mas nada, o velho era teimoso e não os atendia. Ele parece ter desistido de tudo e só se alegrava um pouco quando os netos apareciam. Mesmo assim ele só suportava a visita de um de cada vez.

Jorge quer por força fugir d´Ella, mas está parecendo que é muito difícil. Quem ele acha que poderia dar-lhe apoio nessa fuga está se afastando, talvez as pessoas já estejam enjoadas dos apelos silenciosos que ele faz. Pudera Jorge não verbaliza esses pedidos e, como é normal, as pessoas não lhe prestam atenção. Para um camarada de oitenta anos vividos sem nenhum sobressalto ninguém desconfia que ele precise de ajuda. Talvez uma ou outra. Talvez. Mesmo aquela bela figura que o acompanha desde que a viu pela primeira vez na Malhada naquela tarde ensolarada e quente, parece ter-lhe abandonado.

Ele resolve viajar. Sempre que Jorge vai passar alguns dias na Malhada ele imagina que resulte em alguma coisa boa. Ele espera ver sua “bela figura”, como ele se acostumou a pensar na menina entrevista na tarde ensolarada. Mas, nem sempre é agradável ir na Malhada. Ao contrário ele tem muitas contrariedades, dissabores. É uma merda mesmo. Já fazia anos que ele não dirigia para lá, pois tinha receio de não terminar a viagem e por isso chamava o Pereira para suas viagens; às vezes este lhe levava até o interior onde visitava parentes ou o suposto túmulo de seu avô, lá no Pé da Serra. Logo que o motorista chegou eles viajaram, pois Jorge estava nervoso, impaciente, achando que, dessa vez, alguma coisa de bom lhe aconteceria na Malhada. Quando chegaram a Irauçuba ele nota que havia esquecido de pedir ao Dr. Airton uma receita para seu remédio, sem o qual não se afastava mais de um instante; se lhe faltasse teria que voltar, pois o Tropital só se vende com receita médica e obter uma não seria coisa trivial. Enfim, ele foi arriscando; se ele visse que iria precisar do remédio ele voltaria e, em quatro horas estaria de volta à civilização. Na Malhada, na casa de sua irmã e cunhado, ele esperava se alimentar melhor e pegar uns quilos. Com isso talvez enganasse a Ella que o vinha assediando com mais frequência ultimamente. E sempre havia o consolo de ver a “bela figura”. Mas ele a via constantemente, como agora, projetada nas copas das árvores que passavam enquanto o carro seguia velozmente.

Chegaram à Malhada no domingo à tarde Jorge ficou conversando com a irmã e o cunhado até bem dentro da noite, comendo ostras frescas acompanhadas de um bom vinho, sempre levado por ele, pois o casal gostava bastante, tanto do vinho e ostras como, talvez principalmente, da conversa com a qual todos renovavam os laços de amizade que sempre tiveram. Os três já eram bem entrados em idade e tinham tido as mais diversas experiências, principalmente as familiares, estas sempre desgastantes; discuti-las e aprecia-las sempre foi objeto dessas conversas no Grande Casarão herdado de seus avós.

Jorge decide, ainda no domingo, viajar até ao Pé da Serra visitar alguns parentes para uma boa prosa; muitos dos tios de seu pai ainda moram lá, apesar das inúmeras dificuldades que tinham para manter as pequenas nesgas de terra herdadas de seus pais e avós. Ele sabe que o Pereira não pode levá-lo até lá, ademais seu carro não pode penetrar as estradas de barro sempre esburacadas e tortuosas; seu cunhado telefona para o Martinho e combinam a viagem para cedo na manhã. Este é um motorista eficiente e prestativo que conhece não somente as estradas, mas todo o mundo pras bandas da Serra. Quando chegam à casa do Velho Inácio, na Furna da Onça, Jorge está muito cansado e perturbado; todos na casa notam isso e a um aviso do Martinho preparam uma rede branca, bem limpa e a armam na varanda e levam-no para ela. Jorge consegue dormir um pouco não sem antes ter mirado a “bela figura” que o acompanha sempre projetada na parede branca da varanda. Ele se anima quando as primas que rodeiam o avô o acordam para o almoço. Ele não deixa de apreciar a juventude e beleza dessas primas, distantes herdeiras das velhas tradições familiares e tribais e que também lhe dão atenção especial. A conversa é agradável e, pelas três horas é servido um café gordo, mas rápido, pois os visitantes têm de voltar para a Malhada para não chegar com noite alta.

Martinho se apressa na direção da D20 e tomam logo caminho, pois eles têm de subir um pouco a serra e entrar pelo Socavão do Sancho para depois pegar a estrada que os levará até a cidade. Ao chegar ao Socavão que traz o nome de um antepassado Jorge sente uma necessidade estranha de descer e procurar alguma coisa que ele mesmo não sabe o que é. Encabulado pede a Martinho que pare o carro diante de uma casa em ruínas bem dentro do socavão e desce.

A casa está abandonada, caindo aos pedaços, suja, imunda. Jorge entra e se depara com salas e quartos em abandono completo. Um dos quartos tem uma porta encimada por uma placa, um frontão, com os dizeres “Bem-querer”. É um quarto de crianças com uma penteadeira tendo um espelho grande, vertical, todo enferrujado. Ao aproximar-se do mesmo ele vê a imagem de uma menina – é quase uma menina – de olhos redondos, grandes, aquela “bela figura” de sempre, que lhe sorri e lhe aponta para seu cabelo curto e negro amarrado em um coque. Jorge quer abraçar a figura, mas encontra a lâmina do espelho que se desfaz em inúmeros pedaços. Somente nesse instante ele sente a presença definitiva d´Ella, mas aí não havia como evitar seu chamado. Ele também não queria mais.

Martinho vem correndo ao ouvir o som de vidros quebrados e encontra Jorge abraçado a um pedaço do espelho.

5/6 jan 2009


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Thursday, October 08, 2009

Aforismos do velho Inaço 3


Quero vê tu comê quando o Ináço morrê!

continuação do texto/postagem

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Wednesday, October 07, 2009

HISTÓRIAS DE JORGE RAPOSO 25


LENDO “SCIENCE”

Jorge conheceu Rivanda quando precisou de uma arquiteta para planejar a casa que queria construir na Prainha. Ele tinha comprado o terreno há muito tempo, quando ainda era casado. Ele queria muito ter uma casa onde fosse passar os fins de semana com filhos e netos que estavam começando a chegar. Eles tiveram diversas entrevistas com essa Rivanda e, por fim, chegaram a um acordo sobre o projeto, o orçamento e o detalhamento final. O plano de construção da casa teve de ser adiado por alguns anos, mas foi retomado e Rivanda permaneceu como a construtora, pois fazia parte de uma firma que também se encarregava disso. Ela frequentemente levava a ele no apartamento detalhamento de plantas, orçamentos e folhas de pagamento para ele dar sua aprovação. (...)


Nesse sábado quando ela chegou Jorge estava dormitando em sua cadeira de rodas na varanda com uma revista aberta sobre as pernas. Pé ante pé ela foi dar uma espiada nele. A revista estava aberta em um artigo sobre sinalização em plantas e Rivanda foi logo pensando:

- O velho está devagarzinho voltando a se interessar por Ciência. Será bom isso?

Alguma parte de seu pensamento respondeu:

- Como é que vou saber? Talvez ele não devesse se interessar muito...

Ele estava no laboratório quando uma de suas estudantes veio lhe entregar um envelope volumoso com a marca inconfundível do “Express Post”. Ele logo adivinhou o que iria ver. Quando abriu viu que era o manuscrito que havia enviado para publicação em “Plant Physiology” acompanhado de uma carta do editor da revista e mais algumas folhas soltas que deviam ser os pareceres dos revisores. Ele folheou o manuscrito enviado há duas semanas e notou logo, por sua experiência, que havia sido rejeitado, pois estava todo marcado com lápis vermelho, cheio de pontos de interrogação e de exclamação. Leu a carta do Editor e ficou pasmo com a frase escrita no final: “This manuscript can not be published in this journal in anyway!” Procurou nos pareceres recebidos e percebeu a arrogância e ignorância desses camaradas. É certo que o tema em que eles estavam trabalhando era novo, mas nem por isso deixavam de ser verdadeiras as experiências que eles fizeram. Em um dos pareceres o “referee” afirmava que certamente os autores haviam inventado os dados! Foi muito duro deglutir mais uma recusa; ele já estava acostumado a isso, mas sempre que acontecia ele se revoltava, algumas vezes sem razão, mas muitas, coberto delas. “Pode deixar”, ele falou em um de seus monólogos solitários, “Vamos enviar para outra revista, para outra, e outra mais até que essa droga seja publicada!”

- Leluli chama teu avô. Está na hora do almoço!

Quando o menino aproximou-se da cadeira viu que o avô estava com um sorriso maroto nos lábios.

- Vô você tava sonhando com alguma coisa boa?


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Tuesday, October 06, 2009

HISTORIETAS DO MEIO DA SEMANA 102

TESE MISTERIOSA

Ele era estressado, como se diz hoje. Estava sempre a pensar que alguém queria enganá-lo, roubar-lhe as ideias. Foi para os Estados Unidos fazer doutorado. Passou seis anos para defender uma tese. Quando voltou para assumir seu lugar na Universidade, todos perguntaram sobre os trabalhos que ele publicara a partir dos resultados de sua tese. Ele sempre se esquivava. Certo dia resolveu abrir o jogo e contar o que havia acontecido. Como ele desconfiava que seu orientador quisesse lançar mão de seus resultados e publicá-los como sendo só seus, ele resolve fazer o “copyright” de sua tese. O resultado dessa atitude é que nem mesmo o orientador pôde publicar o trabalho, mesmo com o nome do seu aluno estressado.


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MUNDO MÁGICO NO INSTITUTO JOSÉ XAVIER


O Instituto José Xavier de Granja (CE) abriu (5 de outubro) a exposição Mundo Mágico, uma mostra de brinquedos antigos como, rói-rói, bonecas de pano, trapezistas, pipas.

A exposição objetiva resgatar brinquedos desconhecidos das crianças de hoje, além de mostrar os trabalhos de desenho e histórias produzidos pelas crianças que participam do Projeto Cantinho da Leitura e na oportunidade do Dia da Criança.


continuação do texto/postagem

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Monday, October 05, 2009

HISTÓRIAS DAS TERÇAS 73


SOPA JAPONESA

Ele estava sentado diante de uma mesa tomando uma sopinha, dessas instantâneas, quando chegou um japonês com seu prato de sopa e também se sentou. Este começou a tomar a sua e ele então viu que havia um pequeno peixe vivo no prato do outro e que o camarada tentava leva-lo à boca. Ele falou alguma coisa, reclamando. Subitamente um compatriota do japonês toma as dores do primeiro e diz que ele tivesse mais respeito com os costumes deles, porque no seu país era assim. Ele balançou a cabeça e continuou a tomar sua sopa sem peixe um vivo.



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Brasileiro é 80% europeu


A FOLHA DE SÃO PAULO de hoje (5/10/2009) apresenta matéria de Reinaldo José Lopes sobre a ancestralidade dos brasileiros:

Dados de DNA das cinco regiões do país mostram impacto prevalente de ancestrais brancos, com indígenas em último. Características como cor da pele, dos olhos e dos cabelos correspondem a pequena parte do legado genético que a população carrega


Leia matéria no link da FLSP

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Sunday, October 04, 2009

HISTORIETAS DE SEGUNDA-FEIRA 143


FRANCISCO CÉSAR

O Chico, além de ter uma fixação em nomes e seus significados, era um sonhador, vivia nas nuvens. Sonhava com épocas gloriosas e grandezas do passado mesmo sendo seu passado muito simples. Certo dia ele apareceu no bar com uma história fantástica. Contou que havia sonhado ser um guerreiro gaulês, sob o comando de um chefe ligado a Vercingetórix, em luta contra uma legião romana. Depois que seu comandante morreu eles se dividiram e passaram a agir isoladamente e a fazer guerra entre si. O Chico continuou a contar o seu sonho e disse que, após ter vencido uma batalha e de ter ganhado a posse de uma grande região na Aquitânia, foi coroado rei, dando início a uma nova dinastia. O nome que ele escolheu foi Cocisfran Rasec I, passando à História com o apodo de O Sonhador.

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Saturday, October 03, 2009

CONTOS DA RIBEIRA 11


OLHOS NEGROS

Sentado em sua cadeira no estúdio ele pensava, pois entre muitas outras coisas Jordão também fazia isso, era uma de suas ocupações. Mas, o que se passava agora é que ele só pensava nela, mesmo ao fazer a barba, todas as manhãs; o pior é que Jordão não só pensava, mas a via no espelho, isto é, via sua imagem no espelho do banheiro; ele continuava a vê-la por todo o dia, ao virar uma página do livro que estava lendo, ao olhar para a parede coberta de quadros dos mais diferentes artistas – reproduções, bem entendido – ao olhar para as portas e por aí vai. (...)


(...) Quando saia de casa a imagem dela o acompanhava em cada rua e esquina, em cada sinal, em cada vitrine de loja e em cada café, na bilheteria do cinema. Era uma verdadeira perseguição. Ele via sua imagem com os olhos e com a mente – não seria o mesmo? - e, ele a via também quando, no quarto, deitado em sua rede vermelha, em completa escuridão e com os olhos fechados ele via seu rosto redondo, os olhos negros e brilhantes, o cabelo curto e preto com um coque minúsculo preso com uma pequena e estreita fita vermelha. O pior eram os olhos negros, pois eles emitiam um brilho forte, magnético que o atraíam particular e irremediavelmente. Atraiam para onde e para o que? Ele não conseguia ter uma resposta para essas duas simples indagações. Nessa noite ele via seu corpo de costas e a reconhecia perfeitamente, pois ele tinha, muitas vezes, mirado e admirado suas curvas quando repousava nua, deitada na cama no apartamento da Rua do Azevedo. Agora, quando depois de pigarrear, ele consegue atrair sua atenção para ver seu rosto brilhante e ela se volta em sua direção ele não vê mais que uma face sem nenhuma definição de rosto, boca, nariz e os grandes olhos negros com os quais ele estava acostumado a se mesmerizar.

Fza 18mar09

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Friday, October 02, 2009

FÓSSIL DE ARDI, DE 4,4 MILHÕES DE ANOS, FOI ENCONTRADO NA ETIÓPIA



Esqueleto antigo pode re-escrever o mais antigo capítulo da Evolução Humana.

Pesquisadores descobriram o mais velho esqueleto conhecido de um provável antepassado humano. Ardi - fêmea de 4,4 milhões de anos foi desenterrada na Etiópia e é mais velha que Lucy, 1 milhão de anos mais jovem. A espécie habitava florestas e podia viver no solo ou sobre árvores (Veja matérias na revista "Science" e no "Jornal do Brasil").


Texto completo; leia mais no link.

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Thursday, October 01, 2009

Aforismos do Velho Inaço 2


Velho não pode gastar, pois tem de economizar para seu futuro.

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